Como é planejar um dos maiores carnavais de rua do Brasil?

Ferran Feixas / Unsplash

O Carnaval de SP está entre os maiores eventos do Brasil e do mundo. Os números não mentem, só o Ministério do Turismo estima que 46 milhões foliões estarão nas ruas de todo o país e que esse reencontro da alegria deva movimentar R$8 bilhões na nossa economia, animando marcas e produtores.

A cidade de São Paulo é responsável por uma grande fatia desse bolo, e por entender essa grandiosidade é que nos veio à mente a seguinte pergunta: como é planejar um dos maiores carnavais de rua do Brasil?

Então, perguntamos para o Coordenador de Programação Cultural da Cidade de São Paulo, Vander Lins, que faz parte do øclb comunidade além de ter sido professor do øclb academy.

Em entrevista, Vander respondeu algumas das principais dúvidas da nossa comunidade de profissionais da área de eventos. Arrasta para baixo para conferir na íntegra. ????

Como o governo trata os eventos de rua gratuitos? 

Vander: vale destacar que o Carnaval de Rua de São Paulo é um evento singular, pois ele é de organização compartilhada entre os cidadãos (blocos, cordões, bandas e/ou assemelhados) e a Cidade (órgãos públicos). 

Não trata-se de um evento com determinação unilateral como os de iniciativa privada ou mesmo os da agenda cultural da cidade. Então neste caso, iniciamos definindo a matriz de responsabilidades de ambas as partes, o que é de responsabilidade dos blocos e o que é de responsabilidade da administração pública.

Como se desenvolve a organização técnica (documentos, taxas, autorizações) de um mega evento como este?

Vander: o evento inicia com o Decreto que disciplina o Carnaval de Rua e atribui função às pastas e/ou órgão públicos. 

A partir deste documento é convocada uma Comissão Intersecretarial Multidisciplinar, que trata das necessidades estruturais e de serviços de cada região/bairro/subprefeitura. 

E publicamos o Guia de Regras dos Blocos, juntamente com a abertura de inscrição para os blocos que desejam desfilar no próximo evento. O processo de autorização e/ou licenças é dado conforme cada desfile/trajeto vai sendo aprovado. Então, é publicada uma portaria com estas autorizações. 

Não há cobrança de taxas dos blocos, o Município paga inclusive o ECAD, para que haja facilidade para os blocos. Comumente, preside os trabalhos a pasta que é designada em Decreto. Neste ano a Secretaria Municipal de Cultura é quem preside os trabalhos.

Quanto tempo de antecedência do evento começam os preparativos da organização?

Vander: de forma geral é no tempo que dá, uma vez que a Cidade possui uma agenda muito intensa de megaeventos. Mas comumente os processos iniciam em Setembro do ano anterior ao evento. 

Como é administrada a questão de patrocínios e marcas em um evento público?

Vander: toda oportunidade de parceria, patrocínio e/ou apoio precisa ter regramento legal, por isso é aberto edital de participação, de forma que seja atendido os princípios da administração pública de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Tratamos como qualquer projeto de patrocínio, considerando cotas, capital social, histórico e contrapartidas. A marca (patrocinadora) não possui responsabilidade sobre a organização do evento, e sim sobre as operações/ativações propostas e negociadas baseadas nas contrapartidas.

Como maximizar o uso de capital privado para organização do evento?

Vander: este ainda é um ponto a ser desenvolvido, pois a administração pública não reconhece a marca como um parceiro, e a marca por sua vez não tem interesse em parceria, e sim na visibilidade, ativação e retorno. 

Há inúmeras possibilidades, mas há muita inexperiência de agências e marcas, mesmo as grandes, na compreensão e delimitação do que é público e do que é privado, e como podem ser afinadas estas interseccionalidades.

Você tem dicas para se fazer a gestão de multidões?

Vander: depende do horário, do perfil do público e do incentivo. Temos diferentes estratégias para diferentes públicos, mas ainda que seja um evento único, ele se divide territorialmente, em tempos diferentes, com propostas artísticas diferentes, portanto precisa ter todos estes elementos sendo considerados simultaneamente.

Quais os desafios para tornar o carnaval um evento acessível?

Vander: há algumas compreensões que precisam ser apontadas, antes de se pensar no que é acessível. Estou considerando que estamos falando de acessibilidade de pessoas com deficiência. Para tanto, é preciso separar as necessidades: 

Comunicacional – estas pessoas têm acesso à comunicação, há alguém que consiga dialogar com este público sem segregá-lo, no meio do Carnaval de Rua?;

Atitudinal – os blocos, público, serviços estão prontos para ter este público na multidão? E as pessoas estão prontas para enfrentar este desafio na rua?;

Arquitetônica – As ruas de forma geral são acessíveis, mas o trajeto do bloco não pensa neste item quando decide o desfile, portanto é um desafio ainda maior para pessoas com deficiência transitar numa multidão, sem nem ver direito por onde anda, numa cidade que ainda tem muito a melhorar arquitetonicamente.

Há muitas barreiras a serem quebradas, mas já temos blocos que estão preparados para este perfil de público, ainda que uma porção muito pequena, e a SMPED (Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência) acompanha este desenvolvimento.

Como você estima o público esperado para poder definir a estrutura?

Vander: avaliamos a equação de quantidade de blocos x o público estimado em cada bloco. Consideramos ainda as condições favoráveis à operação, o “sentimento” em torno do evento, e o histórico das edições anteriores.

O que mudou depois de 2 anos sem carnaval de rua oficial, no pós pandemia?

Vander: a Cidade mudou. O “humor da Cidade” mudou. Há um coeficiente elevado de pessoas que estão muito irritadas com o Carnaval de Rua, que não querem, que acham desperdício de recursos, de tempo… enfim, é um resquício da história recente do país. 

Há ainda pessoas que têm medo e/ou são “arautos do caos”, e que “esperam” uma nova onda de Covid e/ou coisa similar. Então de forma geral, neste ano, o carnaval de Rua precisa responder a tudo isso.

O que você faz para não ficar doido com tanta demanda? rs

Vander: tenho uma equipe grande, aproximadamente 260 pessoas, com quem divido as necessidades, e que vão dando andamento em diferentes frentes de trabalho. Mas isso é somente organização do trabalho. Para eu ter um pouco de paz, alterno-me para confiar na equipe, ainda que eu seja muito controlador, e aproveitar os silêncios. O silêncio é o lugar em que me guardo.

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Wow, é um baita desafio, né?! Administrar um evento desse porte requer atenção aos detalhes e, sem dúvida, o Vander Lins vem fazendo um trabalho incrível. Obrigado e muito sucesso, Vander!

Curtiu a entrevista? Mande seu comentário no contato@oclb.com.br e sugira pra gente outros profissionais da área que você gostaria de ver por aqui. 

Um carnaval repleto de brilho pra você! 😉 

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